O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, tem avançado nos diálogos de paz com grupos guerrilheiros, em especial com o Exército de Libertação Nacional (ELN). No entanto, ainda enfrenta resistência e desconfiança por parte dos grupos armados, segundo Luz Angela Rojas, integrante da articulação de movimentos populares do país Congresso dos Povos.
Em conversa com o Brasil de Fato sobre a atuação do ELN e os diálogos de paz com o governo, ela disse que o Estado colombiano não cumpre os acordos que faz com grupos guerrilheiros desde os anos 1950 e a postura de governos anteriores gerou desconfiança no ELN.
“Os diálogos com o ELN são históricos. A desconfiança que as guerrilhas têm não é questão de impedir o diálogo, mas faz parte do reconhecimento da história do nosso país. As elites além de não cumprir os acordos, mataram de forma sistemática militantes”, disse ao Brasil de Fato.
Parte desse descumprimento se dá porque, até então, a Colômbia teve governos ocupados pela direita no país. Para Rojas, esses setor sempre entendeu a paz como a entrega de armas, algo que, para as guerrilhas, é parte importante das negociações para não mostrar fragilidade e vulnerabilidade nos diálogos. Em vez de entregar as armas, o objetivo é se comprometer em não usá-las. Por isso o ELN fala em ciclos de discussão para estabelecer tréguas temporárias.
Segundo a integrante do Congresso dos Povos, o ELN desenvolveu um sistema de inteligência que permite identificar de forma rápida essas violações por parte do governo.
“Quando o ELN fala que o governo não tem cumprido os acordos, além de um chamado, é demonstração da inteligência que tem o ELN, de infiltração e capilaridade no território. Todo esse processo de inteligência e contrainteligência que tem o ELN foi construído por conta desse desrespeito aos acordos”, afirmou.
O ELN tem participado de mesas de negociação por paz com o governo colombiano. A última delas foi em Cuba, em fevereiro. No encontro, as duas partes prorrogaram o cessar-fogo até agosto. No entanto, o ELN acusou em março o governo de ter violado essa trégua, suspendeu as negociações e disse que o processo estava em “crise aberta”. Após esse episódio, o grupo guerrilheiro retomou as conversas e que vai se preparar para o próximo ciclo de debates que será em abril, na Venezuela.
Movimentos e guerrilhas
O Congresso dos Povos é uma articulação que reúne grupos e movimentos populares de diferentes regiões para debater e lutar por melhores condições de vida da população. O grupo é responsável também por mediar debates entre guerrilhas e governo.
Apesar de ter forte presença em locais de atuação ELN e das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), o grupo não tem relação com guerrilhas armadas. Esse, inclusive, é um problema que os movimentos populares enfrentam na Colômbia.
De acordo com Rojas, os veículos tradicionais colombianos tentam associar as guerrilhas aos movimentos sociais e à esquerda no país e, dessa forma, sempre prejudicaram os movimentos progressistas colombianos. Segundo ela, apesar de muitas das pautas levantadas pelos grupos serem comuns aos assuntos abordados pelos movimentos, “não são a mesma coisa”.
Participação da sociedade
A descrença da sociedade por um caminho de paz é um dos aspectos centrais dos diálogos entre governo e grupos armados. Para Rojas, a saída do Executivo é se posicionar e fazer com que as pessoas tenham confiança para se expressar e participar de forma ativa desses diálogos localmente.
Um dos trunfos para isso é a posição de Gustavo Petro na resolução desses conflitos. O diálogo permanente com os grupos armados é uma das políticas implementadas pelo colombiano desde o início do seu mandato em 2022. O presidente tornou oficial a busca pela paz ao transformar a ideia em política de Estado a partir da aprovação da lei 418, que firma o compromisso do Estado colombiano em manter contato para negociar o fim dos confrontos entre esses grupos.
No entanto, há outras barreiras internas que dificultam a atuação do seu governo. Segundo Rojas, uma das principais dificuldades é que alguns postos e órgãos públicos estão controlados pela direita.
“A Colômbia tem algumas peculiaridades. primeiro, é o que chamamos de ‘democracia dura’, uma mistura entre democracia e ditadura. Nunca tivemos uma ditadura como conhecemos, mas nossos governos são divididos claramente entre as classes dominantes e a eliminação dos partidos e projetos de esquerda. Com Petro é diferente, mas ele diz que não tem o poder, pois a burocracia está ocupada pela direita, o que dificulta o avanço dessas negociações”, afirmou.
O ELN foi criado em 1964 sob inspiração da Revolução Cubana e da Teologia da Libertação. Tem presença em duzentos municípios, com cerca de 2,3 mil guerrilheiros, com maior concentração nos departamentos de Arauca, Cauca, Chocó, Nariño, Catatumbo e Antioquia, segundo a Fundação Paz e Reconciliação (Pares).
Edição: Rodrigo Durão Coelho