Daniel Kahneman, considerado o pai da economia comportamental, morreu na quarta-feira aos 90 anos. A informação foi divulgada pelo jornal The Washington Post, citando a enteada Deborah Treisman, editora de ficção da revista New Yorker. A causa da morte não foi divulgada.
Kahneman derrubou as suposições sobre racionalidade que dominaram a economia durante décadas, o que lhe valeu o Nobel de Ciências Econômicas em 2002, que dividiu com Vernon Smith, outro economista experimental.
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Ele conseguiu mostrar a lógica por trás de vários comportamentos intrigantes — como por que as pessoas se recusam a vender ações que perderam valor ou por que dirigem até uma loja distante para economizar dinheiro em um item pequeno, mas não para fazer a mesma economia em um item caro.
Em 2011, Kahneman publicou o best-seller “Thinking, Fast and Slow” (“Rápido e Devagar” na versão em Português), encontrando um grande público para suas ideias. Nele, apresentou seu estudo com uma visão abrangente da mente como contendo dois sistemas, um rápido e intuitivo e outro lento e mais racional.
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Ele oferecia conselhos para a tomada de melhores decisões, começando com: “Reconheça os sinais de que você está em um campo minado cognitivo”.
Influente no mundo da psicologia e da economia
Kahneman era “o psicólogo vivo mais influente do mundo”, na opinião de Steven Pinker, professor da Universidade de Harvard, como disse ao jornal The Guardian em 2014. “Seu trabalho é realmente monumental na história do pensamento.”
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Trabalhando com o psicólogo Amos Tversky, Kahneman isolou os vieses que distorcem a tomada de decisões. Entre eles estão a aversão à perda e a forma como a formulação de uma pergunta pode afetar a resposta. Por exemplo, se um programa de saúde salvará 200 vidas e resultará em 400 mortes, sua aceitação pode depender do fato de seus proponentes destacarem as vidas salvas ou as vidas perdidas.
Kahneman disse que o cérebro reage rapidamente e com base em informações incompletas, muitas vezes com resultados infelizes. Sob a rubrica da “teoria da perspectiva”, Kahneman e Tversky provocaram uma revolução na psicologia e depois na economia, que raramente era considerada uma ciência experimental.
Desafio ao perfil racional
O campo da economia comportamental surgiu no final do século XX, quando um grupo de jovens economistas usou suas percepções para desafiar as noções clássicas do “homo economicus”, o ator racional.
Daniel Kahneman nasceu em 5 de março de 1934, em Tel Aviv, onde sua mãe estava visitando parentes. A família morava na França, tendo emigrado da Lituânia para lá. Seu pai, um químico judeu, foi preso por causa de sua religião durante a Segunda Guerra Mundial e depois libertado. Após a guerra, a família se mudou para a Palestina.
Kahneman se formou em psicologia pela Universidade Hebraica de Jerusalém em 1954. Mais tarde, naquele ano, ingressou nas Forças de Defesa de Israel, onde foi designado para o setor de psicologia e encarregado de avaliar os recrutas. O sistema que ele desenvolveu foi usado durante décadas, conforme escreveu em sua autobiografia para o Prêmio Nobel.
Ele recebeu um Ph.D. da Universidade da Califórnia em Berkeley em 1961 e retornou à Universidade Hebraica para lecionar no departamento de psicologia. Em 1969, conheceu Tversky, que se tornou seu colaborador por mais de uma década em seu trabalho ganhador do Prêmio Nobel.
“Amos e eu compartilhamos a maravilha de possuirmos juntos uma gansa que poderia botar ovos de ouro — uma mente conjunta que era melhor do que nossas mentes separadas”, escreveu Kahneman. “Provavelmente compartilhei mais da metade das risadas da minha vida com Amos.”
A colaboração entre eles gerou artigos, livros e experimentos inovadores, como o jogo do ultimato, no qual uma pessoa recebe dinheiro com a condição de dividi-lo com uma segunda pessoa. Normalmente, a segunda pessoa não aceita menos do que 20% ou 30% de sua parte, mesmo que seja racional aceitar qualquer quantia.
A estreita parceria entre Kahneman e Tversky tornou-se mais conhecida com a publicação, em 2016, do livro “The Undoing Project,” de Michael Lewis, que aborda esse trabalho a quatro mãos.
Kahneman trabalhou na University of British Columbia, em Vancouver, e em Berkeley. Em 1993, mudou-se para a Universidade de Princeton, em Nova Jersey, onde foi professor de psicologia e também lecionou na Woodrow Wilson School of Public and International Affairs.
Dinheiro não compra felicidade
Nos últimos anos, ele estudou a felicidade — mais tecnicamente, hedônica: coisas que tornam as experiências agradáveis ou desagradáveis, e como medir isso. Uma descoberta notável foi a de que as pessoas ricas raramente eram mais felizes do que aquelas com renda mais baixa, desafiando a ideia de que o dinheiro compra felicidade.
Ele deixa dois filhos, Michael e Lenore.