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A história que une os goleiros Mycael e Pedro Morisco, de Athletico e Coritiba

Quem assiste às boas atuações de Mycael, do Athletico, e Pedro Morisco, do Coritiba, não imagina que os goleiros já vestiram a mesma camisa e dividiram a rotina em um mesmo clube.

Antes de conquistarem a titularidade em lados opostos da capital paranaense, os dois se cruzaram no tradicional bairro de Santa Felicidade, na formação do Trieste Futebol Clube. O time fundado por imigrantes italianos na década de 1930 e o maior vencedor da Suburbana – o campeonato de futebol amador de Curitiba – é a conexão entre os jovens arqueiros de Furacão e Coxa.

Quase centenário, o Trieste passou por uma revolução em 2005, quando o empresário do ramo de alimentos Rafael Stival arrendou o clube por 20 anos – acordo renovado recentemente até 2040. De lá para cá, o clube se tornou um celeiro de jogadores e profissionais do futebol.

Atualmente, o Trieste é um núcleo oficial de captação do Flamengo, mas entre 2012 e 2018 mantinha o Athletico como parceiro. Pelas categorias de base do Tricolor de Santa Felicidade passaram atletas como Renan Lodi, hoje no Al-Hilal, Lucas Halter, do Botafogo, e Léo Pereira, do Fla.

Mas formar goleiros é uma das grandes paixões do clube familiar. Além de Mycael e Morisco, o reserva do Furacão, Léo Linck também começou a carreira no Trieste.

A “fábrica de goleiros” também formou os profissionais atuais responsáveis pelo treinamento dos arqueiros da dupla Atletiba, os preparadores Felipe Faria, do Furacão, e Thiago Mehl, do Coxa.

Goleiros do Athletico e Coritiba jogaram juntos na base

Morisco foi o primeiro a chegar ao Trieste, como recorda o diretor técnico do clube, Ricardo Vargas. Nascido em Curitiba, o goleiro de 20 anos já frequentava as escolinhas do Tricolor aos nove anos de idade.

O Pedro saiu das escolinhas do Trieste e, na época, o Leonardo Stival era preparador de goleiros, descobria os goleiros das escolinhas, e os treinava. O Léo trouxe o Morisco para o futebol de campo.

Leonardo Stival foi o responsável por entregar os dois arqueiros à dupla Atletiba. Filho de Rafael Stival, ele sonhava em ser goleiro, mas a carreira não engrenou. Por isso, encontrou na preparação uma forma de se sentir realizado e seguir no esporte.

“Muito legal, preparei os dois, o Mycael e o Morisco. Bons goleiros. Particularmente, eu gosto muito do Pedro, da técnica e do encaixe”, diz Leonardo.

Fora dos padrões, o goleiro coxa-branca, aliás, foi uma aposta pessoal de Leonardo Stival. Quando criança, Morisco estava um pouco gordinho e tinha o físico diferente de outros goleiros em formação.

“Ele estava acima do peso para a biotipia de goleiro, era um pouco acima. Mas tecnicamente era um dos melhores”, conta Vargas.

Acima do peso, Morisco se destacava pela técnica

Depois, o curitibano começou a espichar. Aos 11 anos, Morisco tinha somente 1,63 m. Em nove anos, cresceu 28 cm e agora ostenta imponentes 1,91 m.

“Ele ainda não tinha biotipo para atleta e nossos outros goleiros já tinham. Na época, o titular era o Bernardo [goleiro que faleceu em 2019, no incêndio no Ninho do Urubu], o reserva era o Mycael e o Morisco, ficava de terceiro ou quarto goleiro. E o Léo [Stival] defendia bastante o Morisco devido à parte técnica”, relembra o diretor.

Em 2015, Morisco foi aprovado em um teste no Coritiba e começou a trajetória no Alviverde. Hoje, Leonardo vê o goleiro como titular no Coxa e um dos melhores da Série B, com 102 defesas em 32 jogos.

“Eu pedi calma, ele só tinha nove anos. Eu o defendia bastante, porque a técnica e o encaixe eram perfeitos. Hoje, sinto muito orgulho”, comemora Leonardo, que trata as sequelas de um AVC sofrido em 2020, durante a pandemia de Covid-19.

Depois de perder parte da capacidade da fala e apresentar dificuldades de locomoção, precisou deixar a carreira de preparador de goleiro. Mas a paixão pelo futebol não o impede de voltar, aos poucos, a trabalhar na análise e captação de talentos do Trieste.

O clube, inclusive, montou uma estrutura para o tratamento e fisioterapia de Leonardo. E hoje também atende, por meio de vagas sociais, outros pacientes que sofrem com as sequelas do AVC.

Mycael, de laranja, à esquerda, e Bernardo, à direita, no Trieste quando clube tinha parceria com o Furacão
Mycael, de laranja, à esquerda, e Bernardo, à direita, no Trieste quando clube tinha parceria com o Furacão

Mycael foi descoberto em Rondônia após “premonição”

Apenas dois meses mais novo do que Pedro Morisco, Mycael chegou um pouco depois à capital paranaense. Natural de Porto Velho, em Rondônia, iniciou no Trieste com cerca de 11 anos.

Aluno de uma escolinha do Furacão, o arqueiro precisou participar de duas peneiras antes de desembarcar em Curitiba. Na primeira, passou despercebido. Mas na segunda vez agarrou a oportunidade e brilhou em um dia chuvoso.

“Na avaliação, choveu o dia inteiro, alagou o campo e o Mycael se destacou. Teve que fazer defesas difíceis no campo pesado e por isso escolhemos ele”, relembra Vargas.

Curiosamente, os olheiros do Trieste já estavam preparados para selecionar por causa de uma coincidência. Ou seria premonição?

Ricardo Vargas, diretor técnico do Trieste

No deslocamento entre cidades de avaliação, o tempo mudou, começou a encher de nuvem e vimos uma nuvem no formato de um goleiro fazendo uma defesa. A gente brincou ‘acho que vamos encontrar um goleiro’. E achamos o Mycael. Claro, na época a gente não sabia que ele ia se tornar o goleiro que é hoje.

Futuros rivais, Morisco e Mycael conviveram por cerca de um ano, mas não chegaram a ser amigos próximos. No clube, o melhor amigo do goleiro atleticano era Bernardo, que faleceu no incêndio no Ninho do Urubu, CT do Flamengo, em 2019.

Os dois moraram juntos na casa da mãe de Bernardo, que deixou Santa Catarina apenas para cuidar do filho. Como Mycael veio sozinho do Norte do país, ficou dois anos vivendo com o amigo.

“Aprendi muito”, diz Thiago Mehl sobre início no Trieste

Além dos goleiros da dupla Athletico e Coritiba, os treinadores de goleiros dos rivais, Felipe Faria e Thiago Mehl, também começaram suas carreiras no clube de Santa Felicidade.

Faria e Mehl chegaram a jogar juntos, na base do Coritiba. Depois, o preparador do Coxa focou na carreira fora das quatro linhas. E a primeira experiência profissional foi exatamente no Trieste.

“Criamos um projeto chamado Fábrica de Goleiros, em que a gente treinava os goleiros do Trieste e deixava eles prontos para fazer avaliações em clubes. A partir daquele momento começamos a colocar goleiros em grandes clubes e muitos começaram a procurar nossos goleiros”, conta Mehl.

Thiago Mehl trabalhou na dupla Atletiba
Thiago Mehl trabalhou na dupla Atletiba

No Trieste, Mehl chegou a treinar Felipe Faria, antes de compartilharem a mesma profissão. “Quando eu era treinador de goleiros do sub-20 do Trieste, o Felipe ainda estava jogando na base do Coxa e eu peguei ele emprestado. Ele chegou a jogar o Campeonato Estadual como goleiro e eu de preparador”, relembra.

Faria acabou deixando o posto de goleiro e, a convite de Mehl, foi atuar como preparador, também no Trieste. Depois, os dois ainda trabalharam juntos no Athletico, quando Faria assumiu os goleiros da equipe sub-17, convidado pelo amigo.

“Ele já estava encerrando a carreira na base e eu fiz o convite para trabalhar comigo no Trieste. No início, ele ficou meio resistente, porque ele tinha o sonho de jogar, eu também passei por isso, você não quer abandonar. Mas ele viu que aquele seria um bom caminho também”, conta.

Thiago Mehl, preparador de goleiros do Coritiba

Foi um período muito rico na minha carreira porque ali eu desenvolvi minha metodologia. Foi muito valioso para mim

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