BRASÍLIA – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai pedir votos para o ministro da Justiça, Flávio Dino, indicado por ele para ocupar uma cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF). O movimento de bastidores ocorrerá às vésperas da sabatina no Senado, marcada para o próximo dia 13. Embora o Palácio do Planalto avalie que o ministro terá o nome aprovado, Lula não quer dar “sopa para o azar”, como costuma dizer, e tentará atrair os indecisos, um contingente que hoje alcança quase 20 senadores.
Dino enfrenta a resistência de aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), com quem travou ruidosos embates desde a invasão das sedes do Planalto, do Congresso e do Supremo, em 8 de janeiro. A oposição quer revanche e promete ser agora mais dura do que em junho, quando Cristiano Zanin – o primeiro escolhido por Lula para o STF – teve o nome aprovado em sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.
A votação é secreta, abrindo caminho para traições. Mesmo assim, pelas contas do governo, Dino receberá no mínimo 50 votos. Para ter a nomeação avalizada, ele precisa do apoio de pelo menos 41 dos 81 senadores.
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Wagner afirma que não faz jogo do ‘eu sozinho’
Foi com esse diagnóstico que o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), procurou se aproximar cada vez mais da oposição. “Eu não posso fazer o jogo do ‘eu sozinho'”, disse Wagner ao Estadão, após votar, no último dia 22, a favor da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita poderes do STF.
Wagner provocou a revolta de ministros do Supremo, como Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes. Na véspera, os dois haviam sido informados pelo líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), de que a PEC seria derrotada. Não foi o que aconteceu.
Irritado, Gilmar não apenas telefonou para Wagner, cobrando uma contrapartida do governo a tudo o que a Corte fez para defender a democracia, como reclamou com o próprio Lula, em jantar no Palácio da Alvorada.
“Acharam que meu voto foi uma afronta e eu pedi desculpas, sem reconhecer minha culpa”, contou Wagner. “É claro que o que está acontecendo hoje (aproximação com a oposição) é uma consequência do meu ato, mas isso não foi programado. O líder do governo tem de administrar as diferenças e fazer um gesto aqui e acolá. A gente conversa para um lado e para o outro.”
Ministros do Supremo se movimentam agora para que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), segure a votação da PEC na Casa. No seu lugar, defendem a votação de um projeto de lei bem mais ameno, que contou com a colaboração de uma comissão de juristas, em 2020, presidida pelo próprio Gilmar. Ao Estadão, um magistrado disse, sob reserva, que tem feito articulações no Congresso porque a interlocução política do governo “para ser ruim, precisa melhorar muito”.
O líder do União Brasil no Senado, Efraim Filho (PB), afirmou que nem ele nem os colegas vão se intimidar com a reação do Supremo. “Quem teve o terreno invadido fomos nós”, argumentou Efraim, numa referência ao chamado “ativismo judicial” do tribunal. “Estamos apenas empurrando a cerquinha de volta para o lugar dela.”
O episódio ganhou contornos de crise institucional e, para não agravar ainda mais o problema, Lula decidiu indicar Dino ao Supremo e Gonet à PGR. Os nomes eram defendidos há tempos por Gilmar e Moraes. O presidente sempre quis nomear alguém com experiência política para o STF, sob o argumento de que a Corte precisava de um ministro com esse perfil.
A indicação demorou, porém, porque Lula ficou com receio de Dino ser rejeitado, principalmente após o veto do Senado a Igor Roque para a Defensoria Pública da União (DPU), interpretado como um “recado político” dos conservadores ao governo. Além disso, o petista tinha dúvidas sobre a conveniência de mexer agora no Ministério da Justiça, uma área sensível por abrigar também a segurança pública.
Pressionado, Lula decidiu indicar Dino após ter a garantia de Alcolumbre de que o nome dele será aprovado. Candidato à sucessão de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) ao comando do Senado, Alcolumbre criou problemas para o Planalto quando segurou votações na CCJ, mas destravou tudo, recentemente, após obter acenos de possível apoio à sua eleição, em 2025. Pacheco, por sua vez, está cada vez mais confiante no aval de Lula à sua campanha ao governo de Minas, em 2026.
No domingo, 26, antes da viagem do presidente para o Oriente Médio, Pacheco – que integrou a comitiva – e Alcolumbre ligaram para ele, que estava no Alvorada. Na conversa, avisaram que, se não indicasse Dino e Gonet no dia seguinte, não haveria tempo hábil para que os nomes passassem pelo crivo do Senado ainda neste ano. Lula planejava anunciar suas escolhas somente depois da viagem, mas se rendeu ao calendário ali apresentado.
Liberação de emendas e cargos são moeda de troca na Câmara
A pressão sobre o governo ocorre sem cerimônia no Congresso e vem aumentando neste terceiro mandato do petista. Na Câmara, o toma-lá-dá-cá é cada vez mais explícito. Além de criar todo tipo de manobra para aumentar o valor das emendas parlamentares e liberar verbas destinadas a seus redutos em 2024, ano de eleições municipais, o Centrão também reivindica mais cargos.
Defendido pela equipe econômica para aumentar a receita, o projeto que tributa investimentos em offshores e fundos de alta renda só foi aprovado, por exemplo, depois que o governo entregou a presidência da Caixa para um aliado de Lira.
Antes, o PP e o Republicanos, dois partidos do Centrão, já haviam conseguido o comando do Ministério do Esporte e de Portos e Aeroportos em troca do sinal verde a propostas de seu interesse. Agora, o Centrão quer vice-presidências da Caixa, além de diretorias do Banco do Brasil e da Petrobras.
Na avaliação do deputado Danilo Forte (União Brasil-CE), relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), o governo precisa se entender com os aliados para construir uma pauta.
“Eu tenho até dó do Haddad”, admitiu Forte, ao citar o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. “De um lado há meta fiscal zero, mas todo dia aparece uma despesa diferente. É precatórios do Judiciário, PEC que incorpora novos servidores na folha de pagamento… Se é para fazer populismo eleitoral, o País não aguenta. Se não arrumar a Casa, vamos virar a Argentina”, emendou ele, numa alusão à grave crise enfrentada pelo país vizinho.