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As primeiras visões de como a mega desvalorização do peso argentino pode afetar as empresas listadas na B3

As primeiras visões de como a mega desvalorização do peso argentino pode afetar as empresas listadas na B3

Na noite da última terça-feira (12), o novo governo argentino, liderado por Javier Milei, apresentou o seu “plano de choque” econômico, visando o corte dos gastos públicos e uma forte desvalorização cambial, na tentativa de neutralizar a pior crise econômica do país em décadas.

Em um anúncio pré-gravado, o novo ministro da Economia Luis Caputo anunciou o enfraquecimento do peso argentino de 365 pesos por dólar para 800 pesos. Além disso, as transferências discricionárias para as províncias serão reduzidas ao mínimo e as licitações de obras públicas serão suspensas.

Caputo acrescentou que o governo do presidente libertário Javier Milei reduzirá os subsídios à energia e aos transportes, mas duplicará os gastos sociais para os mais pobres, numa tentativa de evitar um aumento da pobreza, já superior a 40%.

Ainda que à espera de maiores detalhes, os analistas de mercado já começam a fazer as contas e destacam os possíveis impactos, principalmente da desvalorização do câmbio oficial, para algumas empresas listadas na Bolsa brasileira.

Confira abaixo as primeiras análises sobre os impactos nos números das companhia:

Banco do Brasil (BBAS3)

O Banco do Brasil tem exposição à Argentina por meio de sua subsidiária internacional, o Banco Patagonia, no qual detém cerca de 80% de participação.

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Na visão do Bradesco BBI, a desvalorização cambial na Argentina deverá impactar o banco estatal, principalmente pelo reconhecimento dos resultados do Banco Patagonia no câmbio oficial.

O BBI destaca a representatividade do Banco Patagonia no lucro líquido do Banco do Brasil, que saltou para 10,1% nos primeiros nove meses do ano, de 7,5% em 2022, e de 5,5% em 2019/2021. “Além disso, destacamos que o lucro líquido consolidado do Banco Patagonia mais que dobrou em 2022 para R$ 2,4 bilhões, contra a média de R$ 1,1 bilhão de 2019-2021, enquanto observamos que nos primeiros nove meses deste ano já atingiu R$ 2,6 bilhões”, aponta. Na véspera, cabe ressaltar, o BBI rebaixou a recomendação de BBAS3 para neutra, também apontando esse fator de incerteza. 

O JPMorgan também destaca a participação do Patagonia no lucro do BB neste ano de 2023, avaliando ainda que a implementação contínua dos ajustes do novo presidente deve impactar tanto o lucro quanto o patrimônio.

“Esse vento contrário não é novidade. Ainda assim, acreditamos que há ‘partes’ mais complexas e menos negativas ante apenas assumir a desvalorização cambial oficial de cerca de 50%, dos níveis de 365 pesos argentinos para 800 para cada dólar”.

O JPMorgan cita ser verdade que o Banco do Brasil reconhece os ganhos do Patagonia no câmbio oficial e, como o Brasil ainda está sob o BRGAAP (princípios contábeis), não há ajuste de inflação.

“No entanto, a maioria dos bancos argentinos que cobrimos estão, em sua maioria, protegidos contra a inflação e, até certo ponto, contra o câmbio (apesar dos controles cambiais existentes). Notavelmente, os bancos têm uma série de obrigações indexadas a câmbio e obrigações duplas que deverão ajudar a atenuar este vento contrário. Não temos visibilidade sobre a carteira de títulos da Patagonia, mas esperamos que siga uma estratégia semelhante. Em resumo, esperaríamos algum impacto, mas menor do que apenas dizer que os lucros deverão diminuir para metade, uma vez que a empresa poderá ter ganhos extraordinários em títulos neste trimestre”, avalia o JPMorgan.

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Com o BBAS3 sendo negociado a 4 vezes o preço sobre lucro esperado para 2024 (os números do JPMorgan já refletem a desvalorização parcial da Patagônia) e um rendimento de dividendos de 10%, o banco segue com recomendação equivalente à compra (overweight) para os ativos do banco estatal.

Natura (NTCO3) e Mercado Livre (MELI34)

Em relatório em que destaca como empresas do setor de varejo e consumo da América do Sul poderão ser impactadas, o JPMorgan vê a chilena Cencosud, consórcio empresarial multinacional, como uma das mais afetadas.

Porém, entre as brasileiras, o documento cita a Natura, ainda que veja uma mudança provavelmente mínima. “Embora a Argentina represente cerca de 10% das vendas em 2022, acreditamos que o impacto no Ebitda [lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações] e nos lucros consolidados deve ser materialmente menor, uma vez que a empresa tem uma estrutura de despesas relevante no país que é atendida pelo mercado local de geração de fluxo de caixa. No geral, o impacto do lucro por ação não deverá ser material, apesar de alguma volatilidade nas receitas e impactos no Ebitda gerencial”, avalia.

Já sobre a empresa da Argentina Mercado Livre (MELI34), listada na Nasdaq e que tem BDRs (recibo de ações) negociados na B3, o Citi destacou que vê um impacto maior na relação entre vendas e o Ebit (lucro antes de juros e impostos), mas um impacto mais limitado nos lucros.

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Nos últimos doze meses, a Argentina representou cerca de 20% da receita líquida do grupo e entre 35% e 40% de contribuição direta (uma medida aproximada para o Ebitda).

Porém, numa nota positiva, o Citi avalia que a companhia tem sido capaz de crescer seu volume de vendas de mercadoria bruta (GMV) e volume total de pagamentos (TPV) acima da inflação consistentemente, enquanto vê o lucro menos afetado com as recompras de ações.

Ambev (ABEV3)

Para a Ambev, por sua vez, o JPMorgan vê um impacto potencial de cerca de 4% no lucro por ação (e de por volta de 9% no Ebitda).

“Com base nos dados e sensibilidades fornecidos nos comunicados de imprensa recentes da empresa, estimamos que a Argentina seja responsável por entre 13% e 17% do Ebitda da Ambev e um dígito médio a alto em termos de lucro líquido. O lucro líquido é menos representativo que o Ebitda porque a empresa paga impostos mais elevados na Argentina do que no Brasil e porque o hedge é caro no país, pesando nas receitas financeiras e nas linhas fiscais”, avalia.

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Assumindo o peso nos novos níveis potenciais de 800 a 1000 por dólar, o banco projeta que o Ebitda da Ambev poderia cair de 8,5-9,75% em relação aos atuais níveis de caso base de 350 pesos por dólar e o lucro líquido poderia cair de 3,5-4,0%.

“Essas estimativas são baseadas em números anualizados. Mas, considerando a posição de hedge da empresa em peso, acreditamos que poderia haver cobranças pontuais no lucro líquido relacionadas à baixa de alguns valores a receber e, ao mesmo tempo, o impacto no Ebitda seria atenuado, dada a conta de hedge”, avalia.

Alimentos

Além de Ambev, outras empresas do setor de alimentos e bebidas estão no radar dos investidores após o anúncio do novo governo argentino.

O BTG Pactual destacou que a desvalorização cambial, que esteve sob controle nos últimos anos, já era a principal preocupação da casa. Outras medidas anunciadas incluem a abertura das importações e cortes em vários subsídios.

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Os analistas da casa destacam que empresas que vendem para o mercado interno terão impacto negativo.

As empresas que operam na Argentina e reportam resultados em dólar ou real têm convertido seus resultados do peso argentino para uma moeda mais “favorável” (mais forte), embora muitas vezes fosse impossível sacar o dinheiro da Argentina nessas mesmas condições.

“Uma desvalorização abrupta da do peso argentino reduz este ganho e possivelmente leva a efeitos secundários, como a aceleração da taxa de inflação. Isto deverá impactar a renda disponível (e os volumes de vendas) dos argentinos, bem como os custos das empresas”, aponta.

O momento deste anúncio pode ter uma implicação contabilística adicional (negativa) para algumas empresas. Desde a adoção da contabilização da hiperinflação, as regras do IFRS exigem que os resultados reportados incluam a atualização dos resultados acumulados no ano, ajustando pela inflação, antes de convertê-los à taxa de câmbio de fechamento do período, avaliam os analistas.

Espera-se, assim, que os resultados do 4T23 reflitam a atualização dos resultados dos trimestres anteriores com base na inflação acumulada. “Mas como estamos perto do final do ano e é improvável que a inflação reflita uma desvalorização cambial tão abrupta, quando esses resultados forem divulgados o impacto negativo da conversão baseada em um peso argentino mais fraco provavelmente será muito maior do que a atualização do resultados acumulados no ano com base na taxa de inflação oficial”, aponta.

Com base na desvalorização cambial, o BTG estima impactos de -6% no Ebitda de Ambev e Raízen (RAIZ4).

Por outro lado, sob a sua cobertura, empresas como o Minerva (BEEF3) poderão ver um cenário melhor à frente.

“O peso argentino mais fraco deverá naturalmente significar um mercado de exportação mais competitivo e rentável para grãos e carne bovina. Ainda não sabemos o impacto do novo câmbio, pois diversos produtos receberam taxas de câmbio diferentes quando exportados. Numa nota separada, os impostos de exportação sobre grãos (33% no caso da soja, 12% para outros) aparentemente ainda estão em vigor por enquanto. Mas continuamos acreditando que o objetivo do governo é reduzi-los ao longo do tempo”, afirmam.

(com informações da Reuters)