Alexei Navalny, a principal figura da oposição russa e crítico declarado do Kremlin, que ganhou as manchetes globais quando foi envenenado em 2020, morreu, disse o serviço penitenciário russo, nesta sexta-feira (16).
Navalny era há muito tempo uma pedra no sapato do presidente Vladimir Putin, expondo a corrupção em altos cargos do governo da Rússia, fazendo campanha contra o partido no poder e orquestrando alguns dos maiores protestos antigovernamentais vistos nos últimos anos.
Ele retornou à Rússia em 2021 e foi rapidamente preso por acusações que rejeitou, dizendo que possuem motivação política.
Ele estava preso desde então, e as preocupações de longa data com o seu bem-estar tornaram-se mais intensas depois que ele foi transferido para uma colônia penal ao norte do Círculo Polar Ártico.
Navalny “sentiu-se mal depois de uma caminhada” e perdeu a consciência “quase imediatamente”, informou o serviço penitenciário na sexta-feira, acrescentando que estava investigando sua “morte súbita”.
O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, disse que Putin foi informado da morte e que cabe aos médicos determinar a causa da morte de Navalny.
“Tanto quanto sabemos, de acordo com todas as regras, o serviço penitenciário está realizando verificações e esclarecimentos”, disse Peskov a repórteres.
Questionado sobre relatos de que a morte envolveu um coágulo sanguíneo, ele respondeu: “Não sei. Os médicos devem descobrir.”
A porta-voz de Navalny, Kira Yarmysh, disse que seu advogado está viajando para Kharp, onde Navalny estava detido desde dezembro.
“Assim que tivermos qualquer informação, iremos reportá-la”, escreveu Yarmysh no X (antigo Twitter).
Lyudmila Navalnaya, mãe de Navalny, disse ao canal de notícias independente russo Novaya Gazeta que viu o filho pela última vez em 12 de fevereiro – quatro dias antes de sua morte – quando ele estava “vivo, saudável e alegre”.
Ela disse: “Não quero ouvir nenhuma condolência”.
A morte de Navalany acontece pouco antes das eleições presidenciais da Rússia, marcadas para 17 de março, onde Putin concorrerá ao seu quinto mandato, em uma medida que poderá mantê-lo no poder até pelo menos 2030.
Navalny foi condenado a 19 anos de prisão em agosto passado, depois de ter sido considerado culpado de criar uma comunidade extremista, financiar ativistas extremistas e vários outros crimes.
Naquele momento, ele já cumpria uma pena de 11 anos e meio em uma instalação de segurança máxima por fraude e outras acusações que nega.
Quatro meses depois, os seus advogados afirmaram ter perdido contato com Navalny, que se acreditava estar preso em uma colónia penal a cerca de 240 quilômetros a leste de Moscou.
Ele não compareceu a várias audiências judiciais agendadas para dezembro.
Sua equipe jurídica disse, em 22 de dezembro, que ele estava desaparecido há 17 dias. “Navalny nunca esteve fora de vista por tanto tempo”, disse a equipe de Navalny em uma postagem no Telegram.
Depois de apresentar 680 pedidos para localizar Navalny, a sua equipe anunciou, em 25 de dezembro, que o tinha “encontrado” a mais de mil quilômetros de distância, na colônia penal IK-3 em Kharp, conhecida como “Lobo Polar”.
“As condições lá são duras, com um regime especial na zona de permafrost. É muito difícil chegar lá e não existem sistemas de entrega de cartas”, disse Ivan Zhdanov, diretor da fundação anticorrupção de Navalny.
Navalny junta-se a uma longa lista de dissidentes russos que morreram após desafiarem a legitimidade de Putin. Muitos questionaram porque é que ele continuou a sua campanha apesar dos claros riscos para a sua segurança.
“Não tenho medo e não vou desistir do que vou fazer”, disse Navalny à CNN em 2018.
Não vou desistir do meu país. Não vou desistir dos meus direitos civis. Não vou desistir de unir aqueles ao meu redor que acreditam nos mesmos ideais que eu. E há muitas pessoas assim na Rússia.
Alexei Navalny à CNN em 2018
Um crítico feroz de Putin
Navalny representou uma das ameaças mais sérias a Putin durante o seu governo, que já dura mais de duas décadas.
Ele organizou protestos de rua contra o governo e utilizou o seu blog e as redes sociais para expor acusações de corrupção no Kremlin e na economia russa.
Sua luta rendeu uma fama global quando foi envenenado com o agente nervoso Novichok, em 2020.
Navalny foi transportado de avião da cidade siberiana de Omsk e chegou em coma a um hospital em Berlim.
Uma investigação conjunta da CNN e do grupo Bellingcat acusou o Serviço de Segurança Russo (FSB) pelo envenenamento de Navalny.
A investigação descobriu que a equipe de toxinas do FSB, composta por cerca de seis a 10 agentes, seguiu Navalny por mais de três anos.
Mais tarde, Navalny enganou um dos espiões, Konstantin Kudryavtsev, para que revelasse como foi envenenado.
Ele se passou por um alto funcionário do Conselho de Segurança Nacional da Rússia encarregado de realizar uma análise da operação de envenenamento e telefonou para Kudryavtsev, que forneceu um relato detalhado de como os agentes nervosos foram aplicados em uma cueca de Navalny.
A Rússia negou envolvimento no envenenamento de Nalvany em 2020. Putin disse naquela altura que se o serviço de segurança russo quisesse matar Navalny, “teriam terminado” o trabalho.
Respondendo à notícia da morte de Navalny, o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, disse que a Rússia tem “questões sérias” a responder.
“Alexey Navalny tem sido uma voz forte pela liberdade e pela democracia durante muitos anos e os aliados da Otan há muito pedem a sua libertação imediata”, disse Stoltenberg a jornalistas na Alemanha.
O conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, Jake Sullivan, repetiu essas observações.
“Se for confirmado, é uma tragédia terrível, e dada a longa e sórdida história do governo russo de causar danos aos seus oponentes, levanta questões reais e óbvias sobre o que aconteceu aqui”, disse Sullivan em uma entrevista à NPR.
O presidente americano Joe Biden disse anteriormente a repórteres em 2021 que alertou o presidente russo, Vladimir Putin, que as consequências seriam “devastadoras para a Rússia”, se Navalny morresse na prisão.
O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, disse que Putin deve ser responsabilizado pela morte de Navalny.
“É óbvio para mim que ele foi morto”, disse Zelensky em uma coletiva de imprensa conjunta em Berlim com o chanceler alemão, Olaf Scholz.
“Putin não se importa com quem morre, desde que permaneça na sua posição – e é por isso que deveria perder tudo. É por isso que ele deveria perder a guerra e deveria ser responsabilizado pelos crimes que foram cometidos em seu nome”, completou.
“Condições congelantes”
Navalny passou as últimas semanas em uma prisão siberiana a norte do Círculo Polar Ártico, onde disse que dormia debaixo de um jornal para se aquecer e tinha de fazer as suas refeições em 10 minutos.
Ele contou a um tribunal de Moscou sobre as condições “congelantes” dentro de sua prisão, quando apareceu por meio de uma videoconferência em janeiro para descrever seu caso contra as autoridades na colônia penal onde estava detido desde dezembro.
Yarmysh, porta-voz de Navalny, disse que as condições na prisão siberiana eram “muito piores” do que perto de Moscou, onde ele tinha sido originalmente mantido.
“Fica no norte, então faz muito frio lá. Ainda hoje, a luz [solar] lá dura apenas duas horas por dia”, disse ela em janeiro. “Eles definitivamente tentaram isolar Alexei e tornar mais difícil avaliá-lo lá”, completou.
No Dia dos Namorados, um dia antes de sua morte, Navalny postou uma mensagem nas redes sociais para sua esposa, Yulia.
“Querida, com você tudo é como uma música: há cidades entre nós, luzes de decolagem de aeródromos, tempestades de neve azuis e milhares de quilômetros. Mas sinto que você está perto a cada segundo e te amo cada vez mais”, disse ele.
Este conteúdo foi criado originalmente em inglês.
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