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Matheus Pereira revela abusos de drogas e tentativas de suicídio

Matheus Pereira revela abusos de drogas e tentativas de suicídio

Em entrevista ao site The Players’ Tribune, o meia Matheus Pereira, do Cruzeiro, abriu o coração e falou sobre sua infância difícil e muitos problemas que teve com abusos de drogas e álcool durante a carreira.

Atualmente com 27 anos, o camisa 10 da Raposa também revelou que teve diversos pensamentos suicidas quando estava jogando no Al Wahda, dos Emirados Árabes, e quase pulou do 19º andar do hotel em que morava.

Matheus viveu um início de vida conturbado, mudando várias vezes de cidade com a família e depois imigrando de maneira ilegal para Portugal.

Após ser descoberto por um olheiro, ele foi para o Sporting e se tornou um dos grandes destaques da base do time de Lisboa, sendo chamado inclusive de “próximo Cristiano Ronaldo“.

Em conflito com a família, porém, cortou relações com os pais e foi morar sozinho no CT dos alviverdes, quando começou a ter problemas com entorpecentes, bebida alcoólica e baladas.

“Me juntei à rodinha da maconha e passava muito, muito tempo chapado. Também bebia um monte e gastava o dinheiro que sobrava em baladas. Depois me sentia um trapo, um miserável. Me culpava de um jeito insuportável ao imaginar a tristeza dos meus pais se eles soubessem. Eles me deram uma educação cristã, eu sou filho de um lar cristão, nada a ver com aquilo”, contou.

“Como eu podia ser capaz de me perder daquela maneira justamente no momento em que Deus escancarava as portas do futebol pra mim? Não sei. Essa resposta eu também vou ficar devendo”, admitiu.

As coisas começaram a mudar nesse sentido quando, antes de um clássico da base contra o rival Benfica, ele conseguiu dizer “não” às drogas.

“Lá em Alcochete, onde tinha alguns ‘amigos’, a sexta-feira era o nosso dia de enfiar o pé na jaca. Ao final da tarde, juntávamos num canto e eu era o encarregado de enrolar o baseado. Aquilo fazia eu me sentir o cara, forte, sabedor de todas as respostas. Teve uma sexta-feira em que eu enrolei o baseado, passei e, quando ele voltou pra mim, eu olhei a cena toda ao redor e me deu um negócio. Acho que foi o Espírito Santo sussurrando no meu ouvido… ‘Não. Hoje eu não quero droga’, falei pros moleques, que me zoaram. ‘Amanhã tem jogo contra o Benfica e eu quero jogar bem’. Os caras riram”, recordou.

“No dia seguinte, acabei com o jogo e fui sorteado pro antidoping. Imagina! Se fosse em qualquer outra partida da temporada ia dar m***. Naquela, não. De novo eu pensava nas minhas chances. Qual a probabilidade de um imigrante ilegal assinar contrato com um dos maiores times da Europa, ajeitar a vida da família, se perder nas drogas e sair ileso do antidoping? Nesse momento eu acho que Deus falou comigo: ‘Matheus, eu estou cuidando de você. Mas, se você não ajudar, fica difícil’. Beleza, Senhor, entendi. Mas eu não sou capaz de me ajudar. Nunca fui”, relatou.

A situação psicológica do jogador foi ficando cada vez mais complicada com a série de empréstimos feita pelo Sporting. Matheus foi cedido a Chaves, de Portugal, Nuremberg, da Alemanha, e West Bromwich, da Inglaterra.

Na equipe inglesa, ele finalmente conseguiu se firmar e “explodiu” para o cenário internacional ao levar o clube à Premier League, sendo o grande destaque do elenco.

Transferido ao Al Hilal, da Arábia Saudita, o meio-campista mergulhou na depressão e na escuridão ao se mudar para Riade, onde perdeu a igreja e os amigos em que se apoiava na Inglaterra.

Ao seu lado, sobrou apenas sua esposa e um amigo que se mudou junto para trabalhar como motorista, mas que acabou virando uma de suas principais fontes de apoio.

Nesse período, voltou o abuso do álcool, e Matheus Pereira pensou seriamente em largar o futebol profissional.

“Tentando algum alento, nós começamos a ir pra Portugal em todas as folgas. A gente ficava na praia, revia uns amigos, eu me reerguia e… Desabava de novo quando regressava a Riade. Depois, achei que seria uma boa ideia voltar a beber – beber muito. Quem sabe embriagado eu esqueço um pouco de mim? Claro que eu piorei. E piorava ainda mais quando a ressaca passava e eu me sentia culpado pelo que fazia comigo e por não conseguir melhorar”, disse.

“A minha vida era uma repetição que eu não suportava mais. Pedi pra sair do Al Hilal sem saber aonde ir. Naquela altura, eu não queria ir pra lugar nenhum. Eu não queria nada, não tinha mais prazer em nada, não prestava pra nada. Eu era um nada. Já tinha desistido de jogar futebol”, observou.

Ao deixar o Al Hilal, o meia quase acertou com o Corinthians, mas, ciente da pressão midiática que enfrentaria numa das maiores equipes do Brasil, acabou indo jogar por empréstimo no Al Wahda, dos Emirados Árabes.

A expectativa dele e da esposa era que, num país menor e mais tranquilo, ele conseguiria ajeitar a cabeça. No entanto, as coisas pioraram de vez, e Matheus tentou o suicídio.

“O Al Wahda colocou a gente pra morar num hotel de luxo, no apartamento do 19° andar. Até hoje a minha esposa diz que a vista lá de cima era linda. Eu não lembro de ter olhado algum dia pra ela. Pra mim era tudo escuridão e desespero. Eu estava cansado de lutar. Estava cansado de ficar cansado. Eu queria me livrar de tanto sofrimento que eu nem entendia de onde vinha. Tinha noite que eu bebia três garrafas de vinho. Treinei bêbado várias vezes e fiquei outras tantas internado no hospital com hipocalemia, tomando soro pra tratar a falta de potássio no sangue, porque eu não me alimentava, só ingeria álcool”, revelou.

“Até que um dia eu abri a janela do nosso apartamento com vista espetacular e só não me joguei porque a minha esposa foi mais rápida. Ela me agarrou, me puxou pra dentro e a gente ficou um tempão chorando abraçado ali no chão da sala, sabendo que não era o fim – nem o meu, nem o do meu sofrimento”, lamentou.

Pereira começou a fazer sessões de terapia quatro vezes por semana, mas os pensamentos ruins não deixaram sua cabeça.

“Demorou pra eu desistir de morrer. Durante algum tempo, na minha cabeça só tinha uma palavra: morte, morte, morte. A única coisa que eu conseguia enxergar era a morte. Meu amigo motorista até concentrava comigo antes dos jogos. Sozinho, eu era uma ameaça. Podia fazer mal a mim mesmo e aos outros”, apontou.

A vontade de deixar o futebol profissional ainda era grande, e Matheus só conseguiu dar a volta por cima e melhorar quando retornou ao Brasil para jogar no seu time de coração: o Cruzeiro.

“Será que eu seria capaz de reencontrar uma vida autêntica no futebol? Ainda daria tempo? Onde isso seria possível? Qual o caminho? O caminho quem me mostrou foram as cinco estrelas mais bonitas do céu. Aquelas cinco que brilham sobre um azul infinito e glorioso. Quando o Cruzeiro me procurou, eu imaginei as cinco estrelas brilhando em cima do meu coração e falei: ‘Caraca, é isso!’. O que pode ser mais autêntico na minha vida do que o Cruzeiro?”, questionou.

“Se podia dar certo, se havia alguma esperança, o Cruzeiro era o meu único caminho. Juntei as minhas coisas em Portugal e, ansioso, pela primeira vez fiz uma grande mudança por livre e espontânea vontade. No Cruzeiro eu reencontrei mais do que paz. Eu me reencontrei. Parece bobagem, mas não é. Porque no meio da escuridão, e eu andei muito por lá, a coisa mais difícil que tem é a gente se reconhecer. E isso piora demais uma situação que já está ruim. A gente não sabe mais quem é”, seguiu.

“Por isso, quando cruzei o portão da Toca, em julho do ano passado, eu prometi segurar essa mão com toda força do mundo, ser eternamente grato e retribuir com conquistas a confiança do meu clube de coração. Espero que este meu testemunho possa ajudar outras pessoas que estão sofrendo. Hoje eu estou bem. Melhor do que antes. E ainda tenho coisas para resolver e curar”, salientou.

“Mas, enfim, eu me reconheço de novo: no alívio de não precisar mais esconder tudo o que passei, no reencontro com a paixão de menino onde ela sempre esteve e, principalmente, no Mineirão cheio de cruzeirenses em noite de céu estrelado, onde me enxergo sóbrio, inteiro e feliz para cumprir a minha promessa”, finalizou.


Procure ajuda

Caso você tenha pensamentos suicidas, procure ajuda especializada como o CVV (Centro de Valorização da Vida), serviço voluntário gratuito de apoio emocional e prevenção do suicídio para todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo e anonimato.

O CVV oferece atendimento pelo site www.cvv.org.br, pelo telefone 188 (24 horas e sem custo de ligação), por chat, e-mail e também pessoalmente.

Também busque apoio nos CAPS (Centros de Atenção Psicossocial) e nas UBS (Unidades Básicas de Saúde) de sua cidade. São serviços gratuitos de atendimento às necessidades de saúde mental de qualquer pessoa. Mais informações no Disque Saúde, pelo telefone 136.


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