Dezembro carrega doses de expectativa e decepção para donos de lojas de fogos de artifício. É a principal época do ano e que, sozinha, vai sustentar o negócio pelos meses seguintes.
Mas é também quando os comerciantes sentem a nostalgia de um passado que foi bem melhor.
“A venda de fogos de artifício caiu 50% em relação a anos anteriores. Há muita discussão sobre causar efeitos em autistas, crianças e animais. No caso dos animais, é curioso que funcionários de canis venham aqui comprar fogos para adestrar cachorros”, afirma Marcelo Augusto, conhecido como “Bacalhau”, 49, há 22 anos no ramo.
Ele é dono de duas lojas, mas resolveu deixar fechada neste final de ano a localizada na Vila Medeiros, na zona norte de São Paulo. Passa o dia no estabelecimento de Guarulhos, na Grande São Paulo.
O consenso entre quem trabalha com o produto é que, mesmo com a queda no movimento, o Réveillon é o principal momento para vendas. São as que vão manter os comércios abertos até junho, quando começam as festas juninas.
“É quando há maior demanda. Réveillon lidera com folga o calendário pirotécnico. A gente se prepara por um bom tempo para essa época. A renda gerada na temporada dá para para usar boa parte do ano seguinte para pagar boletos. Em janeiro e fevereiro cai muito e só vem conta para pagar”, diz Raul de Barros, 49, presidente da Associação Brasileira de Pirotecnia e empresário do setor.
O dinheiro é fundamental porque até 28 de fevereiro será preciso desembolsar a renovação da licença e se somadas as taxas do Corpo de Bombeiros e Prefeitura, entre outras, o valor pode chegar a R$ 12 mil.
Eles também devem concorrer com vendedores clandestinos que às vezes negociam os fogos de artifício na rua, sem qualquer fiscalização e fora do escopo da lei.
A legislação é, aliás, a grande queixa dos vendedores em São Paulo. Eles reclamam que a lei estadual não foi discutida com quem trabalha com materiais pirotécnicos.
“Nota-se que quem fez a lei não conhece nada sobre o produto”, reclama Barros.
Em São Paulo, é proibida a comercialização, armazenamento, transporte, queima e soltura de fogos de artifício e artefatos pirotécnicos de estampido. Quem descumprir a determinação estará sujeito a multa de até R$ 11.600 no caso de empresas. Pessoas físicas poderiam pagar até R$ 4.300.
“O que determina o que é um estampido? Está claro? Não está. Então, as pessoas escutam ou leem sobre o assunto e acham que todos os fogos de artifício que fazem algum barulho estão proibidos, quando não estão”, se queixa Manuel Porto, 52, que administra um comércio na Zona Norte de São Paulo.
Em um momento chave do ano como o atual, eles acreditam que o movimento nos estabelecimentos e as vendas seriam maiores se as informações fossem mais claras e se os clientes soubessem que nem todos os fogos de artifício estão vetados.
“O clássico rojão está proibido. Isso é fato. Mas a gente está tentando arrumar o pneu do carro com ele em movimento. Há a dificuldade para mostrar para as pessoas o que é permitido. O estalinho que a criança joga no chão faz ruído. Pode? Quando as pessoas entram na nossa loja, a gente consegue orientar. E quem não entra?”, questiona Barros.
O final do ano também é época das grandes queimas de fogos produzidas por prefeituras e empresas. No Rio de Janeiro, a festa da virada terá o espocar de artefatos pirotécnicos em frente ao hotel Copacabana Palace por 12 minutos. Também haverá espetáculos na Praça Mauá e em Bangu.
O show de fogos na Avenida Paulista, em São Paulo, terá 10 minutos. De acordo com a Prefeitura, será dada preferência a artefato que façam pouco barulho, dando ênfase nas luzes e cores.
Os comerciantes do setor reagem com escárnio a isso. Ressaltam que pode fazer pouco barulho mas, ainda assim faz barulho.
“Ano passado, todo mundo comentou que [a festa] foi barulhenta. Eles [da Prefeitura] dizem que é silenciosa, só que colocam o volume da música no máximo para encobrir o ruído dos fogos”, afirma Bacalhau.
Para ele, é tão frustrante que pensa em não continuar.
“Se os meus filhos não ficarem, minha ideia é me aposentar daqui três anos”, completa.
Mas antes, há mais um Réveillon para faturar o dinheiro que vai sustentar o negócio por boa parte de 2024.
“Apesar de tudo, não há nenhuma festa que seja tão importante para nós quanto a do ano-novo”, lembra Barros.