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Valor social das lideranças femininas no Jurídico para equidade de gênero na sociedade 

Valor social das lideranças femininas no Jurídico para equidade de gênero na sociedade 


Opinião

Dia 15 de dezembro é celebrado o Dia da Advogada, data que carrega muita representatividade e abre espaço para a reflexão sobre os desafios que ainda precisamos enfrentar e os espaços que merecemos conquistar. Posto isso, é fundamental trazermos à tona o valor social que as líderes mulheres assumem no setor Jurídico para a equidade de gênero em tantos outros setores da economia nacional.

Em se tratando do universo jurídico, o Brasil conta com 1.371.411 milhões de advogadas e advogados aptos a exercer sua profissão. Desses, mais de 705 mil são mulheres atuantes. Elas são 44.403 mulheres de até 25 anos; 358.422 de 26 até 40 anos; de 41 a 59 anos esse número é de 244.876 profissionais e, finalmente, 86.390 na faixa dos 60+ (dados visitados até a meia-noite de 8 de dezembro de 2023, no site oficial da OAB Nacional).

Myrthes Gomes de Campos, primeira advogada brasileira

Contudo, dos 37 presidentes que a OAB Nacional já teve, desde a sua fundação, todos são homens.  Mas um feito recente no País: a vitória das advogadas Patrícia Vanzolini, Marilena Winter e Daniela Borges nas últimas eleições (2022) para a presidência das seccionais da OAB de São Paulo, Paraná e Bahia, respectivamente, contribuiu para provar o movimento de empoderamento feminino em postos de liderança no meio jurídico.

Outro exemplo recente é a aprovação do nome da advogada Daniela Teixeira para ocupar vaga de ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no final de outubro. Para assumir o posto, ela foi sabatinada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e, apresentando sua força e sua capacidade técnica, obteve 26 votos dos 27 do Colegiado para assumir cadeira na Corte. Para a confirmação, ela precisou ter o nome aprovado pela maioria absoluta do plenário da Casa, onde teve 68 votos.

Mas o caminho para essa conquista não foi nada tradicional. As principais mulheres cotadas à esta vaga assinaram um manifesto em defesa da indicação de Daniela Teixeira que, ligada ao grupo Prerrogativas, é a única mulher da lista sêxtupla elaborada pela OAB. Para se ter uma ideia, hoje, a Corte possui apenas cinco ministras mulheres, entre os 33 ministros que a compõem.

Embora sejamos a maioria nos bancos das faculdades de Direito, como visto acima, as mulheres advogadas ainda ocupam poucos cargos de liderança no mercado jurídico. E o impacto social da ausência de representatividade feminina nas posições de comando pode resultar na falta de perspectivas para outras mulheres, além de criar barreiras para a ascensão feminina na carreira jurídica.

Até o final do ano de 2022, conforme o último relatório Justiça em Números, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Judiciário Brasileiro contava com 40 mulheres à frente da gestão de tribunais. As Presidências do STF e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) também eram ocupadas por mulheres e, dos 27 Tribunais de Justiça, 10 possuíam mulheres na Presidência ou na Vice-Presidência. Dos seis Tribunais Regionais Federais, metade tinha mulheres integrando a Presidência ou a Vice-Presidência.

Apesar desses números parecerem representativos, as mulheres ainda ocupam menos de 30% dos cargos mais altos, o que demonstra a falta de representatividade feminina em posições de liderança no sistema jurídico. Por isso, eu sempre digo que lideranças femininas inspiram outras mulheres a seguir suas carreiras no Direito, a enfrentar as barreiras históricas e a buscar oportunidades de crescimento e desenvolvimento em suas áreas de atuação.

Elas, ainda, quebram estereótipos de gênero, fortalecem o empoderamento feminino na sociedade como um todo e trazem uma perspectiva diferenciada e mais abrangente e analítica para a tomada de decisões nos negócios de maneira geral, contribuindo para a construção de uma sociedade mais diversa e inclusiva. E isso importa muito!

No início deste ano, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), vinculada à Organização das Nações Unidas (ONU), divulgou um estudo em que afirma que as mulheres enfrentam mais dificuldades no acesso ao mundo do trabalho do que se pensava anteriormente, e a diferença de remuneração e condições permaneceram quase inalteradas nas últimas duas décadas.

Ainda de acordo com a OIT, 15% das mulheres em idade ativa no mundo gostariam de ter um emprego, mas não têm, contra 10,5% dos homens, e essa desigualdade de gênero permanece praticamente inalterada por duas décadas. Outro dado importante é de que as responsabilidades pessoais e familiares, incluindo o trabalho de cuidado não remunerado, afetam desproporcionalmente as mulheres em relação aos homens, já que esse tipo de atividade tende a impedi-las ainda mais de trabalhar, procurar emprego ativamente ou estar disponíveis com pouca antecedência.

Todas as profissionais, e não apenas as advogadas, enfrentam aí uma estrutura histórica em que culturalmente foi definido que homens vão ao mercado de trabalho e as mulheres são as responsáveis por cuidar do lar e dos filhos. A grande questão atual é: elas permanecem cuidando da família, mas também estão no mercado de trabalho, estudando, planejando suas carreiras, equilibrando todas as suas funções sociais que envolvem, pelo menos, maternidade, família e carreira.

A grande questão é que mulheres profissionais enfrentam pela frente um mercado que foi historicamente constituído a partir da ótica e da lógica masculinas, ou seja, os perfis do segmento jurídico e de muitas outras áreas foram estabelecidos a partir de noções da rotina dos homens e de seus critérios. E isso acontece desde muito tempo.

Faz-se importante, então, entendermos esse cenário para que possamos enfrentar todos os desafios que ainda há pela frente, de uma maneira mais otimista, encarando que podemos avançar, cada vez mais, nos direitos das mulheres e na conquista de igualdade de gêneros em todas as áreas profissionais.

A diversidade e a equidade de gênero são pautas já não tão novas assim, mas tem ganhado muito mais força na última década.  A pretérita invisibilidade de muitos papeis sociais que as mulheres assumem, começam a ter rostos, e os longos períodos de jornada de trabalho para equilibrar todos os pratos que competem a elas, passaram a ter relevância.

Contudo, a igualdade de gênero e a horizontalidade do setor já deveriam ser uma premissa básica para a consolidação de negócios rentáveis, justos e inovadores.  Embora estejamos em um caminho promissor, ainda há muito que se colocar em pauta. E o porquê digo isso? Para se ter uma ideia, em 2018, o CNJ instituiu a Política Nacional de Incentivo à Participação Institucional Feminina no Poder Judiciário, por meio da Resolução Nº 255.  O intuito é assegurar a igualdade de gênero nos órgãos da Justiça, propondo diretrizes e mecanismos judiciais para incentivar a participação feminina nos cargos de chefia e assessoramento, em bancas de concursos e como expositoras em eventos institucionais (art.2º).

As mulheres que se destacam em suas carreiras podem ser exemplos e atuarem no mercado para que outras mulheres tenham essa oportunidade. A ideia é normalizar a nossa presença em cargos C-Level ou como gestoras de projetos e iniciativas com remunerações e respeito às funções que exercemos, e não por que se tratam de mulheres. Mas ainda é fundamental que haja políticas e iniciativas voltadas para a promoção da igualdade de gênero no setor jurídico, tais como a criação de programas de mentorias, a implementação de políticas de igualdade salarial, a promoção da diversidade nas instituições jurídicas e a valorização do papel das mulheres na carreira jurídica.

Há ainda muitos desafios pela frente, mas também já percorremos um longo caminho que colaborou para chegarmos até aqui e ter espaço para esse tipo de discussão. Que possamos sempre refletir sobre essas conquistas e fortalecer a nossa crença nesse ideal de igualdade da participação das mulheres nos cenários público e privado da advocacia, e em tantas outras áreas de atuação profissional.