As condições necessárias para a fotossíntese acontecer em Marte, processo pelo qual seres vivos como plantas, algas e cianobactérias criam energia química, podem existir abaixo da superfície do gelo do Planeta Vermelho, sugere uma nova pesquisa.
O novo estudo sugere que uma espessa camada de gelo em Marte poderia não só filtrar a radiação do sol, como também permitir a passagem de luz solar suficiente para a fotossíntese, criando “zonas habitáveis”.
Embora nada ainda aponte que a vida exista atualmente em Marte (ou que já tenha existido), os resultados dão aos cientistas envolvidos na busca pelo menos uma ideia de onde procurar.
Não estamos afirmando que encontramos vida em Marte, mas acreditamos que as exposições de gelo marciano empoeirado nas latitudes médias representam os lugares mais facilmente acessíveis para procurar vida marciana hoje
Aditya Khuller, pesquisador de pós-doutorado no Laboratório de Propulsão a Jato da NASA, ao Space.com
Marte fica em “zona habitável” do Sol
Tanto a Terra quanto Marte existem dentro da chamada “zona habitável” do Sol, a região na qual as temperaturas são adequadas para permitir que água líquida exista na superfície de um planeta. No entanto, enquanto 71% da superfície da Terra é coberta por oceanos de água líquida, Marte possui uma paisagem muito mais árida.
Observações de missões a Marte, como os rovers Curiosity e Perseverance, mostraram que nem sempre foi esse o caso. Características geológicas exploradas por esses robôs indicam que água líquida já correu no Planeta Vermelho há bilhões de anos. Além disso, missões voando sobre Marte, como o Mars Reconnaissance Orbiter (MRO) da NASA, encontraram gelo de água em Marte em regiões inesperadas.
Cientistas acreditam que Marte perdeu sua água líquida quando seu campo magnético se extinguiu e sua atmosfera foi quase toda “arrancada”. Isso significa que havia pouco para evitar que a água evaporada fosse perdida para o espaço.
“Ao contrário da Terra, Marte não tem um escudo protetor de ozônio, então há 30% mais radiação ultravioleta prejudicial na superfície”, disse Khuller. “Assim, em Marte, as áreas onde a fotossíntese poderia ocorrer são mais propensas a estar dentro do gelo (…) o gelo empoeirado bloqueia a radiação ultravioleta”.
Estudo descobriu mais segredos sobre o gelo de Marte
Usando simulações de computador, a equipe descobriu que o gelo empoeirado de Marte pode derreter por dentro, com o gelo superficial protegendo essa água líquida subterrânea rasa de evaporar. “Então, os dois ingredientes-chave para a fotossíntese podem estar presentes no gelo marciano”, acrescentou Khuller.
“A fotossíntese requer quantidades adequadas de luz solar e também água líquida para ocorrer. Duas simulações independentes anteriores de neve marciana densa descobriram que o derretimento abaixo da superfície pode ocorrer nas latitudes médias marcianas hoje se pequenas quantidades de poeira (menos de 1%) estiverem presentes na neve.
- As profundidades em que essas zonas habitáveis existem dependem da quantidade de poeira dentro do gelo;
- As simulações mostraram que gelo muito empoeirado bloquearia mais luz solar;
- Gelo com 0,01% a 0,1% de poeira permitiria que uma zona radiativa existisse a uma profundidade entre 5 a 38 centímetros;
- Gelo mais “poluído” permitiria a existência de uma zona radiativa a uma profundidade maior, entre 2,2 a 3,1 metros;
A teoria da equipe tem algum apoio em evidências observacionais vindas não de Marte, mas do nosso planeta. “Fiquei surpreso ao descobrir que há análogos potencialmente similares para a vida dentro do gelo na Terra que contém poeira e sedimentos”, Khuller acrescentou.
Uma vez dentro do gelo a cada verão, água líquida se forma ao redor da poeira escura devido ao aquecimento da luz solar, mesmo se o gelo acima estiver congelado, como uma espécie de tampão. Isso acontece porque o gelo é translúcido, permitindo que a luz solar penetre abaixo da superfície, explica o pesquisador.
“As pessoas encontraram microrganismos que vivem nesses habitats”, disse Khuller. “Os microrganismos geralmente ficam dormentes no inverno, quando não há luz solar suficiente para formar água líquida dentro do gelo empoeirado”.
Claro, nada disso significa que vida fotossintética exista em Marte, mas as descobertas podem estimular novas investigações.
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“Estou trabalhando com uma equipe de cientistas para desenvolver simulações aprimoradas de se, onde e quando gelo empoeirado pode estar derretendo em Marte hoje”, concluiu Khuller.
A pesquisa foi publicada nesta quinta-feira (17) na Nature Communications Earth & Environment.
Com informações do Space.com